segunda-feira, 28 de agosto de 2017

A Internet e os relacionamentos

Percebe-se o quanto a Internet vem revolucionando as modalidades de relação, tanto no aspecto econômico quanto social.
Se por um lado a Internet pode ser um meio facilitador, permitindo que possam ocorrer encontros que de outra forma dificilmente ocorreriam, por outro lado pode haver armadilhas reais no mundo virtual.
A Internet trouxe consigo a era do imediatismo, tudo precisa ser processado em tempo real e com isso, falta tempo para a simbolização, capaz de viabilizar a elaborar que daria um significado ao sentimento.
Um exemplo disso é a seguinte frase, ilustrada em uma rede social:


Em outras palavras: não quero gastar tempo nem energia para processar e elaborar o sentimento de relacionamentos que não deram certo. Com direito a excluir o histórico, ou seja, sem ao menos procurar compreender o quê foi que não funcionou.
Essa frase contextualiza muito bem a demanda repleta de imediatismo, sem espaço para a diferença e a tolerância, necessárias em um relacionamento pautado na realidade.
Se existe um excesso de imaginarização, colocando o outro em um plano idealizado, onde há controle daquilo que se demonstra e também daquilo que se pode captar, é fato que essa imagem precisará ser destituída e descontruída, para dar espaço a pessoa real que do outro, com todas suas qualidades e defeitos.
Seja no mundo real ou virtual, é natural que inicialmente, se idealize o outro, isso faz parte do processo de apaixonamento que normalmente ocorre a partir do investimento emocional no parceiro.
A Internet parece uma via alternativa, onde o sujeito tem a sensação de que pode controlar o grau de envolvimento que almeja ter com o outro. Talvez por saber o quanto é elevado o dispendio de energia inerente ao envolvimento emocional com o outro, onde muitas vezes aparece a sensação de ameaça de não ser correspondido ou ainda, a ansiedade decorrente do risco em se abrir para o novo.
Como uma tentativa de manter-se no controle, corre-se o risco de não se envolver com a pessoa real do outro, mas com aquela idealizada. Procurando evitar riscos, criam-se armadilhas maiores ainda, que podem esbarrar na superficialidade da relação até a frustração ao se deparar com a realidade que necessariamente nunca vem ao encontro com o objeto imaginarizado.
Via de regra, sabe-se que após o encontro com um possível parceiro, vive-se a imaginação de forma muito intensa, quando há a suposição que aquela pessoa pode vir de encontro com o perfil do sujeito ideal, como se visse a si mesmo de forma espelhada no outro.
"O objeto amado é, no investimento amoroso, pela captação que ele opera no sujeito, estritamente equivalente ao ideal do eu." (LACAN, 2009, p.170)
Percebe-se que nos chats que tem como principal objetivo a procura por um parceiro, procurara-se conhecer o postulante a futuro par através da palavra cuidadosamente apresentada pelo outro
Ainda é uma situação muito controlada, pois cada um pode escolher com cautela os pontos e qualidades a serem expostas ao outro. Mas só isso não sustenta um relacionamento, é preciso não se acomodar nesse lugar, muitas vezes permeado de superficialidade.
Não basta abrir a janela dos chats no computador para que a porta do coração também se abra. Para que ocorra uma relação de verdade é preciso sair do plano da idealização, pois duas pessoas só se tornam um casal, se existir envolvimento no plano da realidade.
O virtual por si só, não basta. Relacionamentos reais, são constituídos por meio da relação pautada na realidade, que contempla muito prazer e imaginação, mas também boas doses de frustração, risco e muito envolvimento emocional.

Referência:
LACAN, J. O seminário: Livro 1: Os escritos técnicos de Freud. Rio de Janeiro: Zahar, 2009. (Originalmente publicado 1953-1954).

Nenhum comentário: